sexta-feira, 7 de setembro de 2007

01 - APRESENTAÇÃO

A história folclórica de um doce cujo sabor e fama é conhecida em todo o Brasil.
Pesquisa apresentada à Coordenação do Curso de Comunicação Social, da Faculdade de Filosofia de Campos, sob a orientação do professor Orávio de Campos Soares, como requisito para ser apresentado na 6ª Conferência Brasileira de Folkcomunicação.

02 - RESUMO


Um doce conhecido nacionalmente e que deu fama à cidade de Campos, o chuvisco, foi durante muito tempo um dos cartões postais do município, mas ninguém lembra de sua origem. Sabe-se apenas que a sua receita foi passada através de inúmeras gerações de mãe para filha até chegar aos dias de hoje. Nesta pesquisa, iremos mostrar a sua origem, como surgiu em Campos, e de que forma ele vem se notabilizando e agradando os paladares de pessoas de outros estados brasileiros. Iremos falar também sobre as variedades deste doce, e do pioneirismo de algumas doceiras que resolveram criar a única cooperativa de doceiras do Brasil, bem como das suas dificuldades em continuar a produção deste doce.

03 - INTRODUÇÃO


Ao tentar resgatar as tradições e os valores culturais de Campos dos Goytacazes, o pesquisador se depara com uma quantidade infinita de possibilidades. E muitos deles procuram voltar no tempo e traçar a história do município desde o Brasil-Colônia, passando pela Capitania Hereditária de São Tomé, até os dias de hoje. E nessa linha do tempo, o pesquisador encontra diversos traços marcantes para uma boa pesquisa.
Desde a história da exploração açucareira, dos seus casarios, passando pelos fatos significativos na vida do município, as pessoas que notadamente entraram para a história deste país, bem como aquelas que ficaram para sempre no folclore quotidiano regional, além das lendas e histórias fantasiosas, o chuvisco, alvo desta pesquisa, é um dos segmentos que fazem parte do folclore do município. Pois cada cidade e região deste país se apresentam com um tipo de prato característico, diante das circunstâncias e abundâncias do local.
O chuvisco, que deu fama ao município, na verdade não foi criado aqui. Ele é um doce da culinária portuguesa, e foi trazido quando a Família Real Portuguesa foi obrigada a deixar aquele país, para refugiar-se no Brasil. Era o doce preferido de D. Pedro I. Mas os detalhes sobre o quotidiano da Família Real Portuguesa, bem como das suas preferências gastronômicas eram mantidos em segredo dentro do palácio, e quase nada vazava para a Côrte.
Até que um dia, Mulata Teixeira, uma das doceiras mais famosas de Campos, ganhou a receita de uma pessoa que viera do Rio de Janeiro, e após inúmeras tentativas conseguiu encontrar o ponto do doce que, posteriormente, foi ensinado e passado através das gerações, para outras mulheres da nossa terra.
Com o tempo, algumas mulheres dominaram o conhecimento do ponto ideal tanto da massa como da calda, e eram procuradas por diversas famílias que desejavam enormes quantidades deste doce, para saborearem após os almoços dominicais, ou nas grandes festas.
A partir daí, algumas doceiras ganharam fama, e por terem uma boa clientela, tiveram condições de abrir e expandir seus próprios negócios, como Maria Eugênia de Moraes e Souza, proprietária da M. Eu... Doce. As outras doceiras, que faziam apenas para agradar alguns clientes, mas não possuíam capital, se uniram e criaram, em 1989, a Cooperdoce, a única cooperativa de doceiras do Brasil, fundada apenas por mulheres, conforme consta no livro de cooperativas. E o seu prédio é ponto turístico de gastronomia em diversos guias, como o Guia Quatro Rodas, da Editora Abril Cultural.
Com a chegada de um campista, Anthony Garotinho ao Palácio Guanabara, o chuvisco ganhou uma projeção muito maior na mídia brasileira, principalmente quando começaram a aparecer diversos escândalos de subornos e golpes financeiros contra os cofres públicos do Estado do Rio de Janeiro. Seus assessores, e principais envolvidos nos escândalos foram batizados de “Turma do Chuvisco”, ou “República do Chuvisco”.
Mas, se alguém pensa, que este termo pejorativo dado pela mídia ao doce, foi péssimo para os negócios, receberá da atual presidente da Cooperdoce, Vera Louback, uma resposta surpreendente:

depois desses escândalos, a procura pelo doce aumentou, e recebemos inúmeros turistas em nossa sede querendo saborear o chuvisco.

Além disso, ela informou que:

o chuvisco, que também é conhecido como “pingo de ouro”, a ambrosia, o papo de anjo e os fios de ovos, são doces produzidos com o mesmo tipo de receita, e também são originários de Portugal.

A respeito das variedades deste doce, Vera Louback também cita as variações criadas pelas doceiras:

inúmeras são as variedades deste doce, desde a mais conhecida em calda, até aquelas que foram criadas e testadas pelas doceiras para os paladares mais exigentes. Como por exemplo, o chuvisco cristalizado, em calda com nozes, em calda com passas, chuvisco caramelado, chuvisco com calda de chocolate, e mais recentemente os chuviscos cristalizados coloridos.

Fala também dos ingredientes da receita, e um dos segredos na arte de fazer o chuvisco:

no início as doceiras utilizavam o Creme de Arroz, como produto principal para fazer a massa, mas hoje em dia, com o custo elevado desse produto, as doceiras estão utilizando uma mistura do Creme de Arroz, com um trigo de boa qualidade, e mesmo com essa mistura o chuvisco não perde o sabor tão característico, e as doceiras ainda ganham na quantidade, pois uma caixinha de Creme de Arroz, não dá para fazer uma quantidade muito grande do chuvisco.

Quanto à produção e a quantidade de chuviscos fabricados diariamente na cooperativa, acrescenta que:

Cada receita na cooperativa produz 800 chuviscos, independente da quantidade de ovos. Uma doceira chega a fazer três receitas diariamente o que dá um total de 2.400 chuviscos por dia. Em uma semana, a quantidade média é de 12.000 chuviscos, e em um mês a média produtiva é de 48.000 chuviscos. É claro que não temos uma doceira exclusiva para fazer chuviscos, e com as dificuldades financeiras e operacionais nós fabricamos chuviscos três vezes por semana num total de 7.200 chuviscos. Em um mês a nossa produção é de 28.800 chuviscos.

A respeito da industrialização do chuvisco ela contou que:

o chuvisco, que até ontem era um doce eminentemente artesanal, hoje é produzido em larga escala no município por três empresas: a Cooperdoce, a Doces Nolasco, a Doces Caseiros Boas Novas e também pelas principais docerias do município, como a M. Eu... Doce, e a Marry & Quel.

04 - DESCRIÇÃO DA PESQUISA

Ao iniciar a pesquisa sobre o chuvisco, a primeira coisa que veio a mente é procurar uma indústria e tentar descobrir alguma informação sobre este doce. E por conhecer a presidente da Cooperdoce, Vera Louback, procurei-a e expus o motivo da minha pesquisa.
Curiosamente, ela já havia feito estudos sobre a origem deste doce, e assim através de informações, ela fez um pequeno relato sobre a origem do chuvisco, bem como da iniciativa das 25 doceiras que resolveram criar a Cooperdoce.
Das muitas doceiras que existiram no município, algumas ficaram famosas, como Maria Eugênia de Moraes e Souza, Maria Ilza Cordeiro, Marta Lorenz, Waldéa Ciafrino, e Almira Pessanha, além de outras cujos nomes infelizmente não consigo lembrar, mas que também fizeram fama no município.

Em seu relato, ela revelou que,

a receita deste doce só veio para Campos, porque a doceira mais famosa de Campos, Mulata Teixeira, trouxe a receita e acabou ensinando muitas mulheres da época a fazer esse doce. Assim, esta receita foi transmitida de geração para geração, sempre de mãe para filha.

Por outro lado, utilizando-me de um site de pesquisa da internet, o Google (www.google.com.br), consegui encontrar diversos endereços onde se pode encontrar a palavra chuvisco. Ao fazer uma análise da palavra, encontrei-a com diversas características além daquela que foi alvo desta pesquisa, o doce.
Dos endereços pesquisados e analisados, somente dois informaram que a origem do doce é de Portugal, o site oficial da Prefeitura de Campos dos Goytacazes
http://www.campos.rj.gov.br/subdivide/turismo); e o site da Doceria M. Eu... Doce, www.meudoce.com.br. Nos outros endereços pesquisados onde há receitas sobre o doce http://www.geocities.com/docesefestas/chuvisco.html), http://www.fornoefogaoecia.com.br/motor.asp?R=1037&T=1), www.laguna.com.br, as informações são completamente contraditórias em relação à pesquisa efetuada, e alegam que o doce é originariamente campista.
Recebi da presidente da Cooperdoce, Vera Louback, duas edições de jornais diários do município, o primeiro, o Jornal A Cidade, de 1º de agosto de 1999,


onde se destaca uma enorme foto de uma doceira retirando chuviscos já cozidos de uma panela em fotografia produzida por Wilson Tavares Jr., acompanhada de uma legenda da foto com o título “CHUVISCOS PARA O BRASIL”, e na página 3 do mesmo jornal,


com o título “Produção de doces terá associação – Secretaria de Indústria e Comércio, com apoio do Sebrae e do Senai, quer abrir mercado e estimular novas empresas”, encontra-se uma matéria de pouco mais de um quarto de página, relatando que no dia 29 de julho de 1999, houve uma reunião entre o Subsecretário de Indústria, Comércio e Turismo, Lucena Júnior e a presidente da Cooperdoce (Cooperativa de Doces de Campos), bem como outros representantes de firmas de doces. Na reunião foi resolvido que seria feito estudos para a implantação da Associação dos Fabricantes de Doces de Campos, cujo objetivo seria o de divulgar a produção de doces campistas em outros centros.
Na entrevista para o jornal A Cidade, Vera Louback contou das dificuldades, como os gastos com os impostos, a falta de incentivos na produção de ovos em larga escala dentro do município, e a necessidade de comprar vidros e tampas através de fornecedores de outros estados.
Nesta matéria também foi noticiado que tanto o Sebrae como o Senai dariam o apoio a Associação ministrando cursos para o aperfeiçoamento dos funcionários das empresas. E Vera revelou que muitas doceiras que estavam trabalhando na Cooperdoce fizeram cursos na Fundação Leão XIII. O trabalho da cooperativa é eminentemente social e busca o desenvolvimento da região. E mesmo sem uma divulgação maciça os doces campistas são muito procurados por consumidores de todo o país.
No jornal Monitor Campista, datado de 12 e 13 de maio de 2002, há uma matéria assinada por Nagyla Barreto, com o título “Cooperdoce mantém a tradição bem caseira”, além de um box na mesma página 6 do caderno principal, com o título “Produção deve ser ampliada com projetos em andamento”.


Na matéria publicada a repórter enfatizou a união e o pioneirismo de 25 mulheres que em 1989 criaram a Cooperdoce, mas que no ano de 2002 contava apenas com 18 doceiras. Revelou que a média de chuviscos produzidos era de 2.400 e que eles eram produzidos em larga escala, sem nenhum artifício encontrado na fabricação industrial.
Em um trecho da entrevista Vera Louback, chegou a dizer que o objetivo era investir em marketing, para aumentar o espaço da fábrica e possivelmente receber mais cooperadas, aumentando conseqüentemente a produção de chuviscos da cooperativa.
A reportagem valorizou o lado humano das doceiras e da importância da cooperativa na vida de cada uma delas. Pois a idade se torna um empecilho na conquista de novos empregos, e na cooperativa isso não é um problema.
A presidente da CooperDoce revelou-me também que a filha e a neta de Mulata Teixeira ainda moravam em Campos. E através dos contatos com Márcia (neta), e Ilze de Maria Vasconcellos Mauler (filha de Mulata Teixeira), obtive algumas informações a respeito dessa doceira que foi a pioneira na arte de fabricar chuviscos em Campos.

Na verdade, a minha mãe, Nize Teixeira de Vasconcellos, conhecida como Mulata Teixeira, ganhou esta receita de uma pessoa do Rio de Janeiro, que estava em Campos. A partir desse momento, ela foi quebrando a cabeça até achar o ponto ideal na fabricação do chuvisco.

Ela ainda revelou que:

minha mãe era uma pessoa muito simples, e não gostava de aparecer, mas eu não sei como ela se deixou entrevistar por uma equipe da Revista Globo Rural, cuja reportagem foi publicada pouco tempo antes dela falecer.

Ilze disse também que:

a fama de mamãe era tanta que uma vez quando o ex-presidente Getúlio Vargas visitou Campos, ele veio até aqui em casa para saborear os chuviscos. Além dele, o ex-presidente Juscelino Kubitschek encomendava os chuviscos produzidos por ela. E estes eram saboreados lá no Palácio do Alvorada, em Brasília. O chuvisco produzido por minha mãe chegou a ser levado para fora do país, como por exemplo Paris.

Ilze concluiu o seu depoimento revelando que a doceira mais famosa de Campos nasceu em 1897 e faleceu em outubro de 1986, com 89 anos.

05 - METODOLOGIA

O método empregado na apuração dos dados foi inicialmente o do contato com uma das pessoas envolvidas com o tema da pesquisa. Através de informações prestadas pela presidente da Cooperdoce, Vera Louback, consegui chegar até a origem do chuvisco. Bem como, de outros doces tão conhecidos dos campistas como, a ambrosia, o papo-de-anjo, e os fios de ovos.
Vera relatou também sobre as inúmeras doceiras que existiam na cidade e dominavam a arte de fazer chuvisco, até que a Indústria de Doces Nolasco surgiu há quase cinqüenta anos concorrendo com aquelas mulheres pioneiras que faziam os chuviscos para agradar a sociedade campista e seus familiares.
Com o passar do tempo surgiu a Indústria de Doces Tempestade, que fechou há quase vinte anos e parte do seu patrimônio foi adquirido pela nova administração da Doces Nolasco, segundo informações dadas por um dos diretores daquela indústria, que há vinte e oito anos vem mantendo a tradição e a marca da empresa na arte de fabricar doces. A CooperDoce, surgiu em 1989 com a união de algumas das principais doceiras da cidade; depois surgiu a Indústria de Doces Boas Novas, e as docerias M. Eu... Doce, criada em 1984, e recentemente a Marry & Quel, em 1997.
Sobre a cooperativa ela disse que:

A Cooperdoce é a primeira e única cooperativa no Brasil, fundada por mulheres e todas elas doceiras, e isto está registrado no livro das cooperativas.

Através desses dados, recebi das mãos da presidente da Cooperdoce duas edições dos jornais, A Cidade (1º de agosto de 1999, capa e página 3), relatando sobre a criação da Cooperdoce; e Monitor Campista (edição de 12 e 13 de maio de 2002, página 6), em uma outra matéria jornalística falando sobre a mesma cooperativa, 12 anos depois. E a informação de que tanto a filha como a neta de Mulata Teixeira, residiam em Campos. Diante disso, fui até a neta Márcia, que se prontificou em dar-me algumas informações a respeito de sua avó. Posteriormente, por telefone, sua mãe e filha de Mulata Teixeira, não só reiterou as informações que havia recebido como também fez outras revelações importantes sobre Nize Teixeira de Vasconcellos,

conhecida como Mulata Teixeira, que foi a doceira mais famosa de Campos, e a pioneira na arte de fabricar este doce de origem portuguesa.

06 - ANÁLISE DE RESULTADOS


Ao término da minha pesquisa, com a apuração dos fatos, recolhimento do depoimento de Vera Louback, Márcia e Ilze de Maria Vasconcellos Mauler, e as pesquisas efetuadas através da internet, pude perceber que apesar do avanço tecnológico e da tentativa de industrializar o produto, o mesmo ainda é feito de forma artesanal.
A única diferença se é que existe, é que com a globalização crescente e o maior número de pessoas ligadas à rede mundial de computadores, a receita do doce não será mais repassada através das gerações como antigamente. Mas, é claro, que apesar de tudo isso é provável que alguns segredos na confecção desse doce tão nobre e requintado, ainda será guardado a sete chaves pelas doceiras. É uma pena, que muito pouco foi escrito sobre este doce no passado, principalmente por escritores e jornalistas que viveram e tiveram a felicidade de conviver com aquela que trouxe a receita desse doce para Campos. E assim as gerações futuras aos poucos, ficarão órfãs do conhecimento folclórico e histórico de um dos primeiros e principais cartões postais da cidade. Pois o fio da meada já se perdeu no passado.

07 - CONCLUSÃO

Através do relato da presidente da Cooperdoce, pude perceber uma ponta de orgulho e de tristeza. Orgulho, pelo fato de Campos ter uma indústria pioneira, criada por mulheres e doceiras, que fazem parte de um contexto histórico, folclórico e turístico da cidade. Tristeza, em relação a pessoas públicas que deveriam zelar pelo patrimônio histórico, cultural, folclórico e econômico da cidade. Pois a falta de incentivos fiscais e projetos a avicultura irá certamente dificultar a industrialização adequada do chuvisco.
O município de Campos não possui uma boa produção de ovos que possa suprir as necessidades das principais indústrias de doces da cidade. E estas indústrias são obrigadas a se abastecer de ovos comprados de produtores de outras cidades vizinhas. Gerando com isso, a fuga de capitais e de impostos que são recolhidos por outros municípios.
A indústria do turismo é a que mais cresce no Brasil, ela é chamada de a indústria “sem chaminés”, mas infelizmente somente os empresários, industriais e homens públicos das grandes capitais estão sempre debatendo e procurando meios de atrair mais turistas para as suas cidades. Em Campos, infelizmente, tanto os empresários, os industriais e os homens públicos não abriram os olhos para procurar meios de dotar o município com um ótimo projeto turístico, que possa atrair mais turistas e conseqüentemente gerar mais receita para a cidade.
Campos é uma cidade rica culturalmente, principalmente pela sua importância em relação a história econômica do país. Um município que pode contar a sua história através da fachada dos principais prédios e edifícios é uma cidade que têm todas as condições de ser uma atração turística, tanto para os turistas brasileiros como para os estrangeiros.
A cidade é cortada ao meio por uma das principais rodovias do país, portanto é passagem de um número incontável de pessoas que diariamente cortam o município com destino tanto a capital do Estado, Rio de Janeiro, e ao sul do país, como também para o Espírito Santo, e norte do país.
Falta aos homens públicos desta cidade, mudarem o rumo de sua história. Procurando organizar, criar, incentivar e desenvolver a indústria do turismo na cidade, fazendo parcerias e dotando pessoas, jovens e adultos a resgatarem os valores tradicionais, folclóricos e culturais da cidade. Pois o principal, já está no âmago de cada um dos campistas, a arte de receber bem o turista. É preciso e necessário, que haja todo um compromisso da sociedade campista, para preservar a riqueza histórica, cultural, gastronômica e folclórica de Campos, e assim certamente ainda poderemos saborear e deliciar-nos com o nobre paladar do chuvisco.

08 - ANEXOS

MOÇÃO

Moção de pesar pelo falecimento de
NIZE TEIXEIRA DE VASCONCELOS
17/10/1989 – processo nº 1.458/89

Processo 1.500/89 – 24/10/1989 – Lei 4.939
Projeto nº 185/89 – Denomina Rua Nize Teixeira de Vasconcelos

Art. 1º - Fica denominada RUA NIZE TEIXEIRA DE VASCONCELOS a Rua Projetada A, com início na Rua Prudêncio Bessa e término em terras de terceiros no loteamento da Chácara São Lino.
Art. 2º - Esta Lei entrará em vigor na data de sua publicação.
Sala das Sessões, 24 de outubro de 1989.
Roberto Ribeiro de Souza

JUSTIFICATIVA

NIZE TEIXEIRA DE VASCONCELOS, nascida aos 16 de agosto de 1902, filha de José Nunes Teixeira e Antônia Felisminda Teixeira, nesta cidade. Foi casada com o Sr. Francisco Pinto de Souza Vasconcelos, nascendo desta abençoada união a filha Ilze Maria, que por sua vez, aumentou a árvore genealógica de Dona Nize com três netos e três bisnetos.
Com seus 87 anos, D. Nize, ou melhor a conhecidíssima “Mulata Teixeira”, como carinhosamente era chamada por todos quanto a conheciam de fato e de fama, conseguiu elevar o nome de nosso município a alturas dificilmente igualadas. Começando o seu trabalho com o produto mais popular do nosso artesanato e associando boa dose de criatividade, aliados, ao seu prodigioso paladar, “Mulata Teixeira”, como bem fez jus ao título de “Rainha do Chuvisco”, levou este principal doce de nossa região para muito além de nossas fronteiras.
Criadora também, dos doces modulados, com formas de frutas, foi possuidora de grande popularidade no meio político nacional desde os tempos do saudoso Presidente Getúlio Vargas até os dias de hoje, sendo que o falecido deputado Alair Ferreira, costumava encomendar-lhe chuvisco para presentear autoridades políticas em Brasília.
Tanto se destacou como excelente doceira, que ensinou a sua arte para os já famosos doceiros da não menos famosa Confeitaria Colombo, do Rio de Janeiro e seus doces eram presença obrigatória em todas as festas da sociedade campista.
Por ironia do destino, esta criatura que criou uma “griffe” com sua confecção de doces, tornou-se diabética, mas continuou com a sua fabricação, mesmo sem poder prová-los, pois o seu paladar estava em suas mãos. De acordo com a Revista Globo Rural – “poucos brasileiros conseguiram fazer tanto sucesso em Paris, como a nossa querida “Mulata Teixeira” o fez, mesmo sem sair do Brasil”.
Aos 16 dias do mês de outubro de 1989, “Mulata Teixeira” parte para um outro plano de existência, nos deixando a sensação de que a vida com a sua presença nos parecia mais doce.
Sala das Sessões, 24 de outubro de 1989.
Roberto Ribeiro de Souza

Publicado no Monitor Campista de sábado 11/11/1989.

Os Vereadores José de Almeida Rangel e Adílio Velasco da Silva assinaram o parecer e aprovaram o projeto.

Na época:
Presidente da Câmara Municipal: Carlos Alberto Tavares Campista
Prefeito Municipal: Anthony William Garotinho Matheus de Oliveira

O Prefeito Garotinho sancionou a Lei 4.939 de 27 de novembro de 1989, na mesma data, que foi publicada no Monitor Campista em 01/12/1989.


DEPOIMENTO DE ILZE DE MARIA – FILHA DE MULATA TEIXEIRA

ILZE DE MARIA VASCONCELLOS MAULER
(filha de Mulata Teixeira)
Transcrito e escrito conforme declarações prestadas por telefone

Na verdade, a minha mãe, Nize Teixeira de Vasconcellos, conhecida como Mulata Teixeira, ganhou esta receita de uma pessoa do Rio de Janeiro, que estava em Campos. A partir desse momento, ela foi quebrando a cabeça até achar o ponto ideal na fabricação do chuvisco.
Minha mãe era uma pessoa muito simples, e não gostava de aparecer, mas eu não sei como ela se deixou entrevistar por uma equipe da Revista Globo Rural, cuja reportagem foi publicada pouco tempo antes dela falecer.
A fama de mamãe era tanta que uma vez quando o ex-presidente Getúlio Vargas visitou Campos, ele veio até aqui em casa para saborear os chuviscos. Além dele, o ex-presidente Juscelino Kubitschek encomendava os chuviscos produzidos por ela. E estes eram saboreados lá no Palácio do Alvorada, em Brasília. O chuvisco produzido por minha mãe chegou a ser levado para fora do país, como por exemplo, Paris.
Infelizmente há coisas que não gostamos de lembrar, principalmente sobre a morte dela e de meu pai, que faleceu pouco tempo depois. Mas minha mãe viveu até os 89 anos, e faleceu em outubro de 1986.
O maior prazer dela era passar o dia na frente de seu fogão à lenha cozinhando, criando e inúmeras receitas.


DEPOIMENTO DE VERA LOUBACK

VERA LOUBACK

Presidente da CooperDoce
Depoimento escrito e transcrito

O chuvisco, ambrosia, papo de anjo e fios d’ovos são doces portugueses que vieram para o Brasil com a Família Real, e aqui a Côrte difundiu os saborosos doces que eram a preferência do Imperador.
Em Campos quem surgiu trazendo a maravilha deste doce, o chuvisco, que também era chamado de “pingo de ouro”, foi a conhecida e famosa doceira Mulata Teixeira.
Campos é conhecida não só como a terra do chuvisco, mas também a terra dos doces e suas famosas doceiras. Entre elas estão: Maria Ilza Cordeiro, Marta Lorenz, Waldéa Ciaprino, Almira Pessanha, Maria Eugênia Moraes de Souza e muitas outras.
A Cooperdoce é a única Cooperativa de doceiras, no Brasil, fundada por mulheres e consta no livro de cooperativas. Está no Estado do Rio e no município de Campos.
No início as doceiras utilizavam o Creme de Arroz, como produto principal para fazer a massa, mas hoje em dia, com o custo elevado desse produto, as doceiras estão utilizando uma mistura do Creme de Arroz, com um trigo de boa qualidade, e mesmo com essa mistura o chuvisco não perde o sabor tão característico, e as doceiras ainda ganham na quantidade, pois uma caixinha de Creme de Arroz, não dá para fazer uma quantidade muito grande do chuvisco.
O chuvisco, que até ontem era um doce eminentemente artesanal, hoje é produzido em larga escala no município por três empresas: a Cooperdoce, a Doces Nolasco, a Doces Caseiros Boas Novas e também pelas principais docerias do município, como a M. Eu... Doce, e a Marry & Quel.
Muito antes de surgirem as indústrias as inúmeras famílias da sociedade campista, compravam os chuviscos com as doceiras de fundo de quintal. Até que a mais de cinqüenta anos surgiu a Doces Nolasco e industrializou a produção do chuvisco. Depois surgiu uma outra indústria, a Tempestade, mas que fechou a quase vinte anos, e uma parte do seu patrimônio foi adquirido pela nova administração da Doces Nolasco, que está mantendo a tradição do nome e da marca a mais ou menos vinte e oito anos.
Em 1984, a Maria Eugênia criou a M. Eu... Doce, chegou a ter três lojas, mas hoje conta apenas com uma, na Praça São Salvador. Até que em 1990, nós criamos a Cooperativa de Doces de Campos, Cooperdoce. E agora há pouco tempo surgiu a Marry & Quel.
Campos sempre foi considerada como a terra do chuvisco, mas depois que o ex-prefeito Anthony Garotinho ganhou projeção nacional, e a mídia utilizou o nome do doce de forma pejorativa, as vendas de chuviscos aumentaram. Tem dia que é tão grande o número de pessoas que muitas delas ficam no portão esperando a vez de comprar doces. E nós aqui temos uma boa clientela, principalmente quando policiais militares vêm fazer uma visita ao quartel aqui do lado, e acabam levando o chuvisco, para saborearem com a família, ou com os seus superiores.

VARIEDADES DE CHUVISCOS
em calda
cristalizado
em calda com nozes
em calda com passas
chuvisco caramelado
chuvisco com calda de chocolate
chuviscos cristalizados coloridos

RECEITA DO CHUVISCO

Ingredientes

12 gemas

2 colheres (sopa) de creme de arroz

2 colheres (sopa) de farinha de trigo

1,5 kg de açúcar

6 xícaras (chá) de água

1 colher (sopa) de baunilha

Modo de Fazer

Separe as claras das gemas, passe em peneira e junte o creme de arroz e a farinha de trigo. Misture tudo bem, sem bater, cubra com pano úmido para não ressecarem, enquanto espera a calda. Com o açúcar e a água faça uma calda rala. Separe metade dessa calda em uma tigela e junte uma colher (sopa) de baunilha. Na calda que ficou no fogo fervendo, vá pingando com duas colherinhas (café), bolinhas da massa de gema, quando cozidas, retire-as com uma espumadeira e coloque na calda de baunilha.OBS: Se a calda engrossar, vá pingando água quente para conserva-la sempre rala.

09 - BIBLIOGRAFIA

LOUBACK, Vera – presidente da Cooperdoce – relato escrito.
_____________ – presidente da Cooperdoce – depoimento.
MAULER, Ilze de Maria Vasconcellos – filha de Mulata Teixeira - depoimento
JORNAL A CIDADE. [Diário Norte Fluminense Editora Gráfica e Publicidade Ltda.]. Campos dos Goytacazes, n. 108, ano 66, agosto. 1999.
JORNAL MONITOR CAMPISTA. [S/A Monitor Campista]. Campos dos Goytacazes, n. 105, ano 169, maio. 2002

ALMANAQUE ABRIL 1995. [Editora Abril Cultural]. São Paulo. 21ª ed. pág. 165.

10 - ADENDOS



Campos dos Goytacazes, 15 de setembro de 2007.
Quando comecei a criar esse blog abri um espaço a mais em relação ao meu trabalho, com o objetivo de colocar aqui comentários posteriores à pesquisa realizada. Parecia intuição, não fosse o fato de que a única cooperativa de mulheres-doceiras havia fechado há algum tempo. No corre-corre diário, e na resolução de trabalhos acadêmicos, o tempo fez com que eu deixasse de ler jornais e ficasse inteirado dos fatos.
Lamentavelmente, depois de um ano, é que fiquei sabendo que uma das pessoas mais importantes desse trabalho, e personagem principal do meu vídeo-documentário, falecera.
Por isso, resolvi prestar aqui uma homenagem a essa mulher-guerreira que lutou de todas as formas para dar ao município um diferencial, em relação à cultura e ao turismo.
Vera Louback, desejou levar adiante seu projeto, e dar a tantas mulheres que detêm a arte e o conhecimento de fabricar um dos doces mais requisitados em todas as festas de casamento, o chuvisco, um futuro mais promissor.
Portanto nesse espaço fica o registro e a gratidão de quem um dia a conheceu, sem saber que no futuro ela seria tão importante para mim.
Conheci Vera Louback quando trabalhava para o Jornal A Cidade. Lembro claramente daquela mulher que entrava na redação do jornal e conseguia atrair a atenção de tantos homens e jovens, compenetrados em digitar as matérias que seriam veiculadas pelo jornal, e também pela carga de tensão das horas que precediam o fechamento do jornal.
Com seu vozeirão e seu jeito alegre, brincava com todos, mesmo com os desconhecidos, como eu, que mal haviam entrado para o jornal. E era com essa alegria esfuziante que ela nos deixava, mas o clima já não era mais o mesmo, era mais leve, descontraído, mesmo diante dos momentos cruciais do jornal.
Uma piada aqui, outra ali, era assim que ela nos alegrava. Não me recordo de um dia te-la visto entrar de outra forma, com o semblante fechado ou sisudo. A alegria era sua marca.
E foi com enorme satisfação que anos mais tarde tive o prazer de estar com ela, obtendo tantas informações para esse trabalho.
Vera, se foi. Curiosamente, foram-se também os seus sonhos, as suas lutas, suas realizações. A cooperativa de doces, pela qual ela gastou toda a sua energia, enfim, sucumbiu a sua ausência e a sua tenacidade de lutar por dias melhores.
Fica aqui o meu apreço. O meu respeito, a minha gratidão por alguém que conheci, e lutou tanto para ajudar tantas famílias, e este pesquisador.
(Vera Louback, * 00/00/0000 + 04/10/2005).


Campos dos Goytacazes, 7 de setembro de 2007.

Esclareço que este foi o primeiro trabalho de pesquisa acadêmica realizado por mim na Faculdade de Filosofia de Campos. Não havia tido até então aulas sobre metodologia científica, e desconhecia o fato de que deveria contextualizar a pesquisa com os estudos de Luiz Beltrão sobre a Folkcomunicação. Fato que só aconteceu com as pesquisas seguintes, como as do Carnaval, Santo Antônio, as Reminiscências e a de Zé Gamela.
Neste site está a íntegra original do trabalho, salvo este capítulo ADENDO, que resolvi criar apenas para explicar alguns pormenores do referido trabalho.